
Gustavo Grisa
é MBA de Thunderbird no Arizona e trabalha como executivo em uma multinacional de Telecom em Brasília. Seu site
www.gustavogrisa.com.br tem diversos artigos sobre tecnologia e desenvolvimento.
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É lugar-comum esbravejar contra o poder das grandes
corporações internacionais, e sua interferência na soberania das nações
e outros chavões. O resquício de inquisição do conceito falido de luta
de classes, já desdenhado na maior parte do mundo civilizado, também
pouco ajuda. As empresas, que são em suma formas organizadas de ação
humana, promovem uma das maiores fontes da verdadeira soberania, que é a
própria sobrevivência de nosso sistema social, do emprego e de novos
estágios de produtividade.
É óbvio que existem abusos dos grandes grupos empresariais, mas estes
ocorrem em grande parte por omissão do sistema institucional e legal ou
até mesmo como conseqüência da sua baixa organização. De maneira geral,
a figura do empresário não é vista com bons olhos em um país com uma
formação histórica como a brasileira. A despeito do Brasil ter sido uma
das economias que mais cresceram no século XX, de termos abrigado
empreendedores de todo o mundo que vieram fazer a aventura do
desenvolvimento, continuamos a cultuar grandes tribunos, militares,
intelectuais, mas nenhum empresário. Mauá foi vítima de inveja e desdém
por parte da Corte, enquanto nos EUA os Rockefellers e Morgans eram
reverenciados. Na França, André Citröen, Pierre Dreyfus, célebre
executivo da Renault. Na Alemanha, Werner von Siemens, Krupp. Não é a
toa que o mecenato é tão raro no Brasil. O empresário raramente sente-se
recompensado pelo sistema para retribuir.
Se acreditamos corretamente de que todo poder emana do povo, ainda
demoramos para acreditar que toda a riqueza emana das empresas, por
maiores ou menores que sejam. Principalmente para os mais jovens,
empreender é um mistério e um desafio bastante complicado, com riscos,
contribuições,taxas. Parece muito mais simples buscar colocação no setor
público ou repetir os modos de produção dos pais, para quem tem a sorte
de contar com estes. Esta é uma das explicações para nossos baixos
acréscimos de produtividade.
No longo prazo, é mais do que preocupante esse medo de ser feliz, de
empreender. Preocupante e até compreensível. Nosso sistema educacional
não valoriza o empreendedorismo e a iniciativa privada, e na grande
maioria da população é imputada a noção de que os recursos que existem
na economia foram criados através de geração espontânea, e de que os
impostos e os benefícios sociais não necessitam de um sistema produtivo
saudável para se sustentar. A burocracia e a carga tributária também
jogam seus baldes de água fria.
O papel das empresas no desenvolvimento em todo o mundo é cada vez
maior, a integração com fornecedores locais para comercialização global,
o conceito de economia de redes. É uma realidade a que temos que nos
adaptar, do tipo decifra-me ou te devoro. É importante diferenciar
capitalismo, que envolve risco e recompensa, de patrimonialismo, que
significa imobilismo, sociedade fechada e privilégios de classe quase
medievais. O choque de capitalismo que Mário Covas pregou há 15 anos no
Congresso continua urgente e intransferível. No campo, na cidade e na
cabeça dos brasileiros. A pior indignidade é a indignidade da pobreza.
P.S. Para aprofundar-se no assunto, há o pragmático artigo do economista
Charles Oman, da OCDE - "The Changing Role of The Firm in Development".
Agosto 2004
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