Marcos Dutra, MBA - Editor     

   

A Tentação de Enrolar o  Consumidor 

Por Marcos Dutra    

   

       
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Marcos Dutra é editor do Pensando Marketing e profissional da área com passagem em empresas como Johnson & Johnson, Sadia e Credicard, graduado com distinção no MBA de Thunderbird, nos EUA.

 

 

Parece mesmo que o maior inimigo do marketing ainda é o board de reuniões. Idéias que parecem sensacionais no papel ou no flip chart ainda conseguem ir para a frente sem passar pelo simples teste do consumidor. Coisas assim não acontecem em grandes empresas, você pode pensar...será mesmo ? Milhões de dólares, carreiras internacionais em jogo: a tentação é demais.

Se a gente puxar pela memória, consegue lembrar do caso do Betamax. Nos anos 80, houve uma grande briga sobre qual dos formatos de vídeo cassete seria adotado, o Betamax da Sony ou o VHS dos concorrentes. Basta olhar para sua estante da sala para ver quem ganhou. O Betamax era na teoria melhor tecnicamente, mas o VHS tinha maior disponibilidade de fitas e era mais barato, o que para o consumidor importava mais.

Daria para pensar que a Sony teria aprendido a lição, mas surpreendentemente a empresa está a caminho de cometer o mesmo erro. A questão é a seguinte: fora dos olhos do consumidor, corre uma grande briga para se definir qual será o novo padrão de DVDs, que será capaz de mostrar toda a qualidade da TV de alta definição que está chegando. A Sony aposta em seu padrão, o Blu-Ray, enquanto a Toshiba traz o HD DVD. Os dois usam lasers de luz azul, mais precisos, no lugar dos lasers de luz vermelha atualmente em uso.

Pois é aqui que o vírus do “vou enrolar o consumidor” entra em ação. A Sony acaba de comprar o estúdio MGM, que somado a suas aquisições e à própria Sony Pictures, pode lhe dar uma grande alavancagem em seu novo formato. Certamente essa idéia é bem próxima de concorrência monopolística e truste de mercado. A idéia é que a disponibilidade de títulos destes estúdios force o consumidor a escolher o Blu-Ray para ser seu próximo DVD player.

Porém, como o crime mercadológico não compensa, a Toshiba está para anunciar um acordo com vários outros estúdios, entre eles a Warner. Estes estúdios disponibilizarão títulos em seu novo formato HD DVD, mas se reservam ao direito de não-exclusividade (ou seja, podem usar o outro formato também). Porém, a Toshiba tem um enorme trunfo: seu formato é backward compatible, permitindo que os leitores consigam tocar os DVDs antigos. Bingo. Quem vai comprar um DVD player que força o consumidor a jogar fora todos seus DVDs ou então ficar sem tocar os discos da locadora da esquina, que vai demorar uns três anos para trocar seu estoque de filmes para o formato novo ?

Mais exemplos como as empresas não aprendem? O vírus da enrolação tem infectado as fabricantes de impressoras, como todo mundo que tem que pagar um preço abusivo por um cartucho de tinta sabe. Para piorar, os fabricantes, como a HP, diminuem a quantidade de tinta nos mesmos modelos de cartuchos com a única intenção de explorar o consumidor. Ao invés de competirem na área em que deveriam, oferecendo produtos melhores que a concorrência, tentam criar um ambiente de monopólio artificial com a introdução de chips nos cartuchos que não servem para nada a não ser impedir que cartuchos de terceiros funcionem em suas máquinas.  Na verdade, essa estratégia é a mesma que vender carros que funcionam só com gasolina da Esso ou refrigerante que só dá para beber em um copo especial que custa uma fortuna.

Porém, recentemente uma corte dos EUA derrubou uma ação da Lexmark contra uma pequena empresa que fabrica os chips que permitem a produção de cartuchos de terceiros para estas impressoras. Ainda bem.

Finalmente,se você ainda tem alguma dúvida sobre a inevitabilidade das leis do marketing (em um ambiente não-monopolístico, cabe notar), uma última notícia vai convencê-lo. Depois de todo esse esforço para espremer o consumidor, a Epson percebe o que o mercado quer e começa a anunciar suas impressoras como aquelas com os cartuchos mais baratos ! Ou seja, voltamos ao ponto de partida.

Alguma dúvida sobre qual a marca da minha próxima impressora?

DEZEMBRO 2004

 

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