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Gutemberg de Macedo, M. Div.

Presidente da Gutemberg Consultores S/C Ltda

Prêmios Top of Mind
2002, 2003 e 2004

Consultor especializado em Outplacement, Executive Coaching e Career Counseling

www.gutemberg.com.br


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Coaching Executivo: Mito e Realidade (XI)

Gutemberg de Macedo


Este artigo é a parte XI de uma excelente série que pode ser encontrada no site do autor, www.gutemberg.com.br

"Your living is determined not so much by what life brings to you
as by the attitude you bring to life; not so much by
what happens to you as by the way your mind
looks at what happens .”

John Homer Miller

"Nunca se deve perder tempo lamentando inutilmente o passado ou
se queixando das mudanças que nos causam aborrecimentos,
pois a mudança é a essência da vida .”

Jacques-Anatole François Thibault, romancista e crítico, 1884-1924

Foi Heráclito, filósofo grego, VI século a.C, quem chamou a atenção para a perene mobilidade de todas as coisas: nada permanece imóvel e nada permanece em estado de fixidez e estabilidade, mas tudo se move, tudo muda, tudo se transforma, sem cessar e sem exceção. É este, sem dúvida, o aspecto de sua doutrina filosófica que se tornou mais célebre ao longo da história.

Heráclito, para demonstrar essa verdade, valeu-se da imagem do fluir de um rio, em fragmentos que se tornaram célebres: “De quem desce ao mesmo rio vêm ao encontro águas sempre novas... Não se pode descer duas vezes ao mesmo rio e não se pode tocar duas vezes uma substância mortal no mesmo estado, mas por causa da impetuosidade e da velocidade da mudança, dispersa-se e recolhe-se, vem e vai... Descemos e não descemos ao mesmo rio, nós mesmos somos e não somos.” (Diels-Kranz, 22 B 12).

O sentido de sua metáfora é claro: o rio é aparentemente sempre o mesmo, mas na realidade é feito de águas sempre novas, que se acrescentam e se dispersam; por isso à mesma água do rio não se pode descer duas vezes, justamente porque, quando se desce a segunda vez, já é outra a água que se encontra; e porque nós mesmos mudamos; no momento em que completamos a imersão no rio, tornamo-nos diferentes em relação ao momento em que nos movemos para mergulhar; como sempre diferentes são as águas que nos banham; assim, Heráclito pôde dizer, sob o ponto de vista filosófico, que entramos e não entramos no rio. E pôde também afirmar que somos e não somos, porque, para sermos o que somos em dado momento, devemos não ser mais aquilo que éramos no momento precedente, assim como, para continuar a sermos, devemos logo não ser mais aquilo que somos neste momento. E isso vale, segundo Heráclito, para todas as coisas, sem exceção.

Nunca na história das civilizações foi tão verdadeira a observação desse filósofo. Afinal, todos nós, independentemente de berço, idade, formação, fortuna, posição social ou hierárquica corporativa, experimentamos, diária e continuamente, mudanças em nossa vida e carreira – ingresso no mercado de trabalho, casamento, nascimento de um filho, perda de peso, forçada ou programada, aquisição de casa, promoção a uma posição ambicionada, volta à faculdade para obtenção de novos conhecimentos, transferência para outro departamento ou país, chegada inesperada de novo chefe, mudança de empresa ou de carreira, demissão, entre tantas outras formas de transição.

Pesquisadores e estudiosos da transição adulta, à semelhança dos sábios gregos e romanos, têm demonstrado que a vida segue uma seqüência de estágios ou fases e que, à medida que os ciclos da vida progridem, nós não apenas nos movemos através de períodos de desenvolvimento e de transição, mas também somos chamados a gerenciar e a solucionar, com inteligência e sabedoria, os problemas deles decorrentes. Nosso sucesso, hoje e no futuro, dependerá em grande parte da maneira como abordamos as diferentes transições por que passamos ao longo de nossa vida e carreira.

A história humana é rica em exemplos que apontam para a impermanência de todas as coisas. Dentre os muitos exemplos, que poderia citar neste trabalho, dois são extremamente recentes:

O primeiro, vem da experiência de uma bem-sucedida executiva, Kathleen Ligocki, atualmente CEO – Chief Executive Officer da Tower Automotive, que no início de sua carreira profissional desejava ser uma professora de história da China, porém, atualmente empreende uma carreira executiva: “I wanted to get my master’s and Ph.D. and live the academic life. Business is something that grew on me. I didn’t know it was something I would grow up to do. My father was in business for a long time, but I don’t know what kind of impressions I had of it – but particularly in the automotive world, I know I wouldn’t have expected to be better. I think when I was growing up and thinking of things I wanted to do, business would’ve been at the bottom of the list.” (Peter Han, “Nobodies to Somebodies,” 2005, página 19).

O segundo exemplo foi descrito no jornal “Valor Econômico” (5 de janeiro de 2005, página D-6, seção EU & CARREIRA), em matéria de autoria da jornalista Alice Azevedo. Segundo ela, a advogada carioca Luana Sanches foi surpreendida com a notícia de sua demissão, logo após voltar da lua-de-mel. Decepcionada, uma vez que tinha planos ambiciosos para a própria carreira, decidiu mudar completamente o rumo e o destino de sua carreira: “Prometi que nunca mais passaria por tal situação – a de saber de uma hora para outra, que não estava mais empregada. Naquele momento optei por não procurar nova colocação no setor privado e decidi estudar para fazer um concurso.” Aprovada, dois anos depois, em processo de seleção para exercer a função de oficial de justiça, ela disse: “Agora posso fazer planos, estudar até para outros concursos ligados à minha área e tocar a vida sem temer o fantasma da demissão.”
 

Ao discorrer sobre a transição de carreira, tenho em mente a definição proposta por N.K. Schlossberg, em “Overwhelmed: Coping with Life’s Ups and Down” (1989): mudança de função ou posição (“roles”), relacionamentos, rotinas e conjecturas (“assumption”) acerca de mim mesmo ou do mundo ao meu redor:

• Mudança de função ou papel: novas atribuições e responsabilidades
(promoção e/ou mudança de carreira).
• Mudança de relacionamento: a conquista de novo emprego significa mudança de relacionamento com subordinados, pares, superiores, clientes, fornecedores, credores e, muitas vezes, com a comunidade.
• Mudança de rotina: a execução de novo trabalho ou projeto requer mudanças em rotinas, quer administrativas quer operacionais.
• Mudança de hipótese, Mudança radical de carreira, estilo de vida, conjectura sobre si mesmo reconhecimento da capacidade e do talento ou sobre o mundo ao seu pessoal redor: Os casos acima descritos apontam para uma transição que envolve os quatro tipos de mudanças – de papel, relacionamento, rotina e da hipótese acerca de si mesmo e do mundo ao seu redor.


Sabemos, por experiência adquirida na condução de projetos de outplacement, coaching executivo, career counseling e retirement planning que as mudanças, não importa sua natureza ou grau de intensidade, afetam os indivíduos de maneira diferente. Entretanto, o sucesso de uma transição bem conduzida depende em grande parte do grau de auto-estima, autoconfiança, atitude, perspectiva, tolerância e preparo para encará-las com coragem e ousadia. A aposentadoria, por exemplo, pode constituir verdadeiro pesadelo para o profissional que não se tenha preparado adequadamente para ela. Por outro lado, pode constituir verdadeiro encanto para aquele que a tiver preparado com sabedoria.

Recentemente, aconselhei um vice-presidente de importante empresa multinacional européia em processo de transição de carreira (retirement planning) que ilustra essa realidade. Confesso que fiquei impressionado com a maneira pela qual ele estava conduzindo essa fase de transição de vida, em geral difícil de ser assimilada, com visão otimista, segura, agradável, consciente de suas novas responsabilidades e, sobretudo, com consciência libertária – vendo-se dono de si mesmo, do tempo disponível e do próprio destino.

Por outro lado, tenho aconselhado inúmero outros que encaram a aposentadoria como uma espécie de funeral ou o apagar definitivo da existência – pessimistas, desmotivados, confusos, sem saber o que desejam ou que rumo tomar. Prisioneiros do próprio passado, mostram-se incapazes de olhar o futuro com ousadia e destemor, tais são os sentimentos negativos que os dominam.

Reconhecemos que qualquer transição – grande ou pequena – leva tempo para ser assimilada e eficazmente ajustada a uma nova situação. Richard Edler, autor dos livros “Ah se eu Soubesse” e “O Significado da Vida,” levou dois anos para se adaptar à realidade existencial que se seguiu à morte de seu filho e, posteriormente, à perda do emprego. Luiz Alberto Alvernaz, ex-presidente e CEO da Mercer Recursos Humanos, levou dois meses aproximadamente para se ajustar à nova realidade pós-demissão e o fez com grande mestria e sabedoria. Mudou radicalmente a maneira de encarar a vida, a carreira profissional e o mundo ao redor. Resultado dessa transição: o surgimento de um homem e de um profissional renovado.

Toda transição tem três fases: a primeira, segundo afirma, Williams Bridges, no livro “Transitions: Making Sense of Life’s Changes” (1980), não importa qual seja a sua natureza ou duração, começa com um“ending” (fim). É o momento em que o profissional envolvido tem de abdicar do velho, antes de incorporar o novo; a segunda fase é descrita como “zona neutra” – um período de pensamentos confusos e indefinidos, “emptiness,” um vazio interior, um período de solidão, indispensável para o processo de reorientação interior, de renovação, de construção da autoconfiança, de coragem para olhar para a frente e caminhar e, acima de tudo, para alcançar o autoconhecimento e entender a própria vida. Finalmente, a terceira fase: o início da nova vida.

Mas a transição, como a descrevemos, não obedece a um padrão. Ela varia de pessoa para pessoa e apresenta variada gama de formatos, dimensões, intensidade e combinações. Recentemente, aconselhei um executivo que passara por três mudanças abruptas de vida – a demissão, após 23 anos na mesma empresa, a separação no casamento e a morte inesperada do pai. Tudo quase que simultaneamente.

Existem três tipos básicos de transição:

A primeira é a transição consciente e planejada. A preparação é racional e objetiva. O profissional a antevê e assume a responsabilidade de empreendê-la com maturidade emocional e racional para evitar surpresas e sobressaltos.

A segunda, uma transição forçada, decorrente, em geral, de fatores imprevistos e que, por isso mesmo, colhe o profissional de surpresa e o encontra despreparado. Os exemplos incluem: o cônjuge que comunica o fim de um longo casamento, a perda do emprego depois de carreira estável em uma única empresa, a perda inesperada de um filho em acidente de automóvel ou de moto. Esses eventos traumatizam, chocam, deixam qualquer pessoa confusa e insegura e, ao mesmo tempo, a desafiam – é preciso encontrar uma saída.

Quem quer que tenha lido o livro, “O Monge e o Executivo”, de James Hunter, deve ter percebido essa realidade. O bem-sucedido executivo, após dezoito anos de casamento, aparentemente, feliz, foi surpreendido pelo desejo da esposa de se divorciar.

A terceira transição, conhecida como “nonevents”, é aquela que se deseja ardentemente, mas que nunca ocorre. Há um sem-número de exemplos para ilustrá-la: o filho ansiosamente sonhado, que jamais virá ao mundo por problemas genéticos; a namorada sensualmente idealizada que existirá apenas na fantasia, a promoção ambicionada que nunca será efetuada, a sorte grande em qualquer jogo lotérico, que movimenta milhões de reais e conduz a milhões sonhos que jamais se transformarão em realidade. Em filosofia, há um termo latino – “futuribile” – que expressa com clareza essa realidade: aquilo que tem total possibilidade de existir, mas que nunca vai sair da esfera do possível e realmente existir; nem mesmo chegará a ser provável; ficará sempre sob o domínio da não-existência. Muitos outros exemplos poderiam ser citados, mas eles também permanecerão como um “futuribile”.

Posso ver e distinguir, com grande clareza, o descortino de todas essas fases na vida de qualquer pessoa, na de meus clientes, inclusive, em transição de vida e carreira. E, quando percebo que atingiram a terceira e última fase, vejo uma nova aurora em sua vida e carreira – os olhos voltam a brilhar; as idéias tornam-se claras; os pensamentos, positivos e construtivos; as ações, focadas e firmes; as atitudes, otimistas e corajosas; os relacionamentos, abertos e enriquecidos; as competências, fortalecidas e reativadas; o autoconhecimento refeito e aprofundado; a autoconfiança e a auto-estima restabelecidas e renovadas; as amizades multiplicadas e valorizadas.

Daí porque, a Gutemberg Consultores, festeja com grande intensidade o renascer de todos os seus clientes. Costumo comparar esse sentimento à estação da primavera, em países de clima frio, onde após longo inverno, as flores brotam, o azul do céu resplandece, as crianças, os jovens, os adultos e os idosos caminham por ruas e alamedas e começam a povoar floridos parques, de onde se ouve o barulho de motos e carros sem capota, e onde também a natureza se reveste de nova vida e esplendor. Tudo é festa. Tudo é alegria. Tudo é motivo para comemoração.

Nesse instante delicado da vida de milhares de profissionais, a ferramenta de gestão do capital humano, conhecida como coaching executivo, é de importância vital, uma vez que poderá ajudar esses mesmos profissionais a fazerem a travessia de vida sem grandes traumas e prejuízos, tanto no campo pessoal e familiar quanto no profissional.

Minha posição se justifica por inúmeras razões:

Primeiro, o consultor experiente e versátil na condução de projetos dessa natureza, além de possuir sólida compreensão dos ciclos das mudanças, deve ter sólido e profundo entendimento de biografias, rituais e ritos de passagens – todos eles manifestações inequívocas de transição. Conseqüentemente, ele deve ser capaz de conectar o passado, o presente e o futuro dos indivíduos, restaurando neles o prazer de viver e de trabalhar. Além disso, deve ser capaz, não necessariamente de lhes sugerir novos caminhos e desafios, mas de despertar neles a faculdade de refletir e amadurecer as próprias escolhas e decisões. Ninguém é tão sábio e poderoso a ponto de decidir por – em lugar de – outra pessoa.

Segundo, o consultor pode ajudá-los nas várias fases da “ending experience”: disengagement – ajudando-os a quebrarem as “algemas de ouro” do passado –; disidentification – a quebra das antigas conecções -; disenchantment – a flutuação entre dois mundos –; disorientation – o sentimento de orientação perdido.

Terceiro, a transição é um dos períodos mais ricos da vida e da carreira em aprendizado e, também, um daqueles raros momentos da vida, em que todos os canhões de luz estão focados no profissional e no seu futuro.

Quarto, os profissionais que tiverem a oportunidade de identificar com clareza seu verdadeiro objetivo de vida, poderão viver uma vida compatível com seus valores, interesses, filosofia e missão de vida. As palavras de Jack Welck são uma advertência que merece reflexão: “Quando se trabalha para atender às necessidades ou realizar os sonhos de outra pessoa sempre se acaba sofrendo as conseqüências” , ou ainda: “Se um emprego não o fizer vibrar em qualquer nível – apenas por causa de seu conteúdo – não o aceite.”



 
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