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Os oligopólios são inevitáveis?

Um fato extremamente interessante passou despercebido no mundo do marketing neste mês, mas que traz consigo um enorme significado para os marqueteiros e a economia em geral. Está de volta no ar, depois de mais de 7 anos, o comercial do Kolynos, aquele no qual os jipes voam e ao passar por um outdoor se transformam em lanchas....tudo em um mundo de água e refrescância.

 

Deixando de lado a ótima qualidade da produção e o excelente briefing da melhor gerente de produto deste país (minha mulher, Milene) o que chama a atenção é que este é agora o comercial não mais do Kolynos, mas sim do... Sorriso !

 

É comum que comerciais antigos voltem ao ar, mas talvez seja a primeira vez em que um comercial feito para um certo produto é veiculado para uma nova marca. A única explicação que faz sentido é que o posicionamento de marca, equity e value proposition dos dois produtos sejam idênticos. Conhecendo-se a qualidade do marketing da Colgate, no qual não costuma faltar coerência, fica claro que este é o caso. Para todos os efeitos, o Sorriso é o Kolynos.

 

O problema é que a marca Sorriso só passou a existir por uma exigência do Cade, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Esta instituição tem mostrado seriedade e transparência em suas funções. Suas funções estão claramente definidas no website (www.cade.gov.br):

 

Entre outras atribuições, ao CADE cabe zelar pela livre concorrência, difundir a cultura da concorrência por meio de esclarecimentos ao público sobre as formas de infração à ordem econômica e decidir questões relativas às mesmas infrações.

 

Entretanto, parece que esta é uma missão cada vez mais difícil. Quando a Colgate comprou a Kolynos, a intençào do Cade era a de evitar uma enorme concentração de mercado nas mãos da Colgate. Sem a concorrência da Procter & Gamble, que não fabrica a marca Crest aqui, o único concorrente de peso seria a Unilever com Close-Up. Para se diminuir o impacto desta compra, o Cade ordenou à Colgate que colocasse na geladeira a marca Kolynos, então a líder de mercado, por cinco anos.

 

A princípio, todos pensaram que Kolynos retornaria, após uma difícil fase para a Colgate. Não foi o que aconteceu. Impulsionada por uma enorme campanha de comunicação com atores famosos da TV e sua massiva rede de distribuição, Sorriso retomou a liderança alguns meses depois, no que foi considerado um grande caso de marketing. Agora, com o retorno do comercial, o ciclo se fecha...é quase como se Kolynos nunca tivesse deixado de existir, ou melhor, como se sempre tivesse se chamado Sorriso.

 

A grande questão que paira no ar é se a decisão do Cade teve qualquer efeito na luta contra a oligopolização. Sem dúvida, a mudança de nome custou muito dinheiro para a Colgate, mas quem ganhou com isso, além das agências de propaganda? A preocupaçào aumenta porque decisões semelhantes, como a venda da marca Bavária no caso da fusão da Antárctica com a Brahma, que criou a Ambev, dão prosseguimento à esta estratégia.

 

Na verdade, no mundo globalizado de empresas poderosas e bilionárias, apenas medidas radicais poderiam evitar a concentração de capital, como a obrigatoriedade de um split (divisão) na empresa, aos moldes do imposto pelo governo americano à antiga empresa monopolista de telefonia Bell, que criou as chamadas Baby Bells, entre elas a AT&T. No caso da Colgate, sua capacidade de produção, sua força de marketing e equipe de distribuição eram tão avassaladoras que não puderam ser impedidas por uma mudança de marca. Vale lembrar que a marca não é apenas um nome, mas também toda uma série de atributos e associações que ela carrega, incluindo facilidade de encontrar, logotipos, cores, aroma, etc. Se o nome muda mas todo o equity (conjunto de associações) permanece, a maior parte da marca continua firme na mente do consumidor.

 

Outro fator muito importante é que a concentração de capital gera grandes vantagens de custo (até R$ 504 milhões por ano no caso da Ambev*). No mundo globalizado, nenhum país prefere ter empresas pequenas, sem competitividade global, para proteger os interesses da livre concorrência interna. Não é de se estranhar, portanto, que o processo contra a Microsoft tenha dado em nada. Os EUA não gostariam de simplesmente diminuir a competitividade da empresa para que uma outra, européia talvez, tomasse seu espaço.

 

A sociedade e o governo precisam urgentemente pesar os prós e contras desta situação, porque se por um lado a concentração gera competitividade, por outro lado o consumidor sofre com escolhas mais limitadas, o mercado de trabalho sofre com cortes de pessoal e fornecedores e clientes perdem poder de barganha contra monstros monopolistas. As consequências a longo prazo são uma diminuição da criatividade empresarial, maior dificuldade para empresas iniciantes e potencial aumento de preços. 

 

 

Agosto 2003